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quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Mudar o mundo

Às vezes eu me pergunto qual é a diferença fundamental entre pessoas ou empresas que exercem real impacto no mundo e aquelas que pensam ou existem aparentemente por conta de propósitos econômicos. Estou convicto de que a diferença realmente existe, uma vez que o propósito se evidencia nas linhas de ação tomadas. Normalmente as empresas que se enquadram no primeiro tipo nascem de pessoas visionárias, que desejam fazer algo de valor. A Apple, por exemplo, na visão de seu líder Steve Jobs, desejava simplesmente transformar o mundo por intermédio da tecnologia. E conseguiu. A ironia é que os websites desse tipo de empresa normalmente não fazem uso do tradicional artifício de explicitar sua missão e sua visão, como o faz o segundo tipo de empresas, que normalmente dizem que sua visão é ser, em um número menor possível de anos, a melhor empresa do setor. As empresas do primeiro tipo não precisam ter essa visão. A visão de transformar o mundo lhes basta. Afinal, é tão simples transformar o mundo...

Esse tipo de pensamento nos leva também a pensar no papel do sonho e da realização pessoal no contexto empresarial. O tipo de pessoa sonhadora normalmente tem dificuldades no ambiente empresarial tradicional, pois é vista como alguém desconectado do mundo. Já ouvi várias vezes frases do tipo "esse cara viaja" e "é um lunático". Um dos refúgios dos críticos a pessoas sonhadoras é rotulá-las como teóricas. Na verdade, esses críticos não levam em conta a teoria - e muito menos a imaginação - em suas ações. Os sonhadores, por sua vez, imaginam, e usam a teoria para dar base às suas ações. No fundo, uns buscam transformar o mundo, colocando a imaginação e a teoria como sustentação para ações que possam contribuir com esse nobre fim. Outros buscam refúgio na tentativa de sistematização do conhecimento, na "intocabilidade metodológica" como forma de garantir a continuidade da situação.

Uma coisa que tenho notado nesse tipo de ambiente é a turbulência que as pessoas sonhadoras exercem na situação sustentada pelo metodismo (não estou falando de religião). Em empresas sobreviventes tradicionais, a gestão é voltada à garantia de continuidade, ao método intocável e à minimização de riscos. Sonhadores representam uma ameaça brutal a essa tríade. Dessa maneira, empreendimentos vislumbrados por sonhadores e fundamentados no binário teoria-imaginação são veemente e camufladamente atacados pela gestão, na tentativa de aniquilar qualquer turbulência que implique aumento de risco. Os argumentos usados para justificar a reprovação de propostas sonhadoras normalmente não têm pé nem cabeça, e as sessões de julgamento parecem isentas de qualquer lógica, o que acaba por afetar, aos olhos dos sonhadores, a reputação daqueles que manifestam tais argumentações.

Os impactos desse tipo de repressão à inovação são diversos, a começar pela desmotivação e o descrédito por parte dos proponentes, o que causa a diminuição do potencial de inovação na empresa. Isso, por sua vez, traz sérios riscos relacionados à sobrevivência da empresa, e o destino obscuro tão temido pela gestão acaba se concretizando. O que está errado nesse processo? É justamente a falta de compreensão de que a saúde da empresa é hoje representada especialmente por sua capacidade de gerar o novo, de se questionar e mudar.

Sob o ponto de vista dos empreendedores sonhadores, a situação se torna insustentável. O que acontece na prática é que, "vestir a camisa da empresa", como ainda hoje se requer pela gestão, se torna uma tarefa impossível, já que o tamanho dessa camisa é PP. Recentemente ouvi uma preleção que dava a entender que o profissional deveria se confundir com a empresa. Para os sonhadores, isso até é possível, se a missão da empresa onde trabalha fosse "mudar o mundo". Caso contrário, eles estarão cada vez mais desconectados, já que ninguém pode segurá-los.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

O mal

O mal é inerente ao ser humano. Porém há aqueles que realçam seu relacionamento com o mal, usando-o como arma para fazer conquistas. Algumas vezes o uso do mal não é exatamente percebido pelo seu portador. Outras vezes parece ser coisa do subconsciente. Mas há casos em que o mal trabalha explicitamente na estratégia pessoal. Sem nos atermos à origem desse fenômeno, podemos perceber seu impacto em todos os ambientes, inclusive no ambiente de trabalho, profissional e até mesmo acadêmico. Afunilando ainda um pouco mais nossa análise, abordemos a questão da inovação e do empreendedorismo no ambiente de trabalho. Qual é normalmente o perfil dos empreendedores? E seus interesses, a que estão alinhados?

A resposta parece simples. Empreendedores são normalmente pessoas sonhadoras, que desejam realizar em detrimento de acumular riquezas excessivamente, não obstante o fato de uma coisa não implicar a outra. As pessoas do mal (vamos chamá-las carinhosamente assim) não têm interesse em realizar sonhos. O que importa para elas é o sentimento de poder, seja ele trazido por riquezas, seja ele trazido pela percepção de mandar ou subjugar pessoas. Tem sido assim desde a fundação do mundo.

O que mais me intriga é que tudo isso que escrevi até agora parece coisa do passado, algo ao qual deveríamos já estar imunes. Mas não. O mal continua reinando na sociedade, e traz muitos prejuízos às pessoas e, especificamente, ao foco deste texto: o ambiente de trabalho. Ao analisar o mal na empresa, percebo que ele se aflora quando é dirigido aos empreendedores, pois estes tendem a ter uma postura ingênua no tocante a possíveis ciladas de caráter pessoal. Eles normalmente não vêm o mal nas pessoas. Em muitos casos, até mesmo recusam-se a acreditar quando são informados sobre sua ocorrência.

O mal, uma vez domiciliado no interior de uma pessoa, perpetua-se mediante a afinidade e a atratividade que faz aflorar entre si os portadores de tal peste. Um jogo permanente de interesses estabelece um vínculo entre aqueles que fazem o mal, o que facilita sua escalada ao que chamam de poder. Ao chegar ao poder, veem os sonhadores, empreendedores e lunáticos como aqueles que lhes podem ofuscar o brilho. Assim, conscientemente, ou subconscientemente, ou mesmo inconscientemente - pouco importa como - eles os massacram psicologicamente, tentando roubar-lhes aquilo de que não podem abrir mão: sua dignidade. Matam assim a criatividade, por meio do controle e do exercício do poder aparente.

Perpetua-se assim a mediocridade, a mesmice e, por fim, a pobreza de espírito. O mundo, em vez de se voltar às realizações que trazem o bem, volta-se ao mal, que ardilosamente procura retirar os benefícios da sociedade e transferi-lo para seus portadores. O ambiente de trabalho, em vez de se tornar propício às realizações que trazem valor, torna-se o palco de uma batalha velada, cujo vencedor não existe. E o que acontece com os sonhadores lunáticos? Continuam sonhando e realizando. Onde? Remando contra a correnteza, no mesmo lugar ou alhures.

sábado, 11 de junho de 2011

Remando contra a correnteza

Um dia eu vi um artigo na revista The Economist sobre os empreendedores brasileiros. O autor dizia que se você estivesse sentado a uma mesa no Sushi Bar, em São Paulo, não iria demorar para escutar, vinda de uma mesa vizinha, uma discussão sobre como iniciar um empreendimento para produzir energia a partir de alguma planta inusitada, ou então alguma ideia original para livrar a classe média do país de seus baixos salários.

O Brasil realmente não carece de pessoas inovadoras e empreendedoras. Segundo um estudo feito por uma instituição de renome, os empreendedores brasileiros apresentam um comportamento bem diferente de seus companheiros da Rússia e da China. A principal diferença entre os empreendedores desses países é que os brasileiros aparentam ter um apetite bem menor a riscos.

O estudo se aprofunda para averiguar o porquê dessa característica peculiar do empreendedor brasileiro, chegando à conclusão de que o motivo consiste no fato de que esses empreendedores correm em sua vida de negócios riscos muito maiores do que aqueles que vivem nos outros dois países, ou em qualquer outro lugar do planeta.

Começar um negócio no Brasil leva 152 dias e requer 18 processos diferentes. Um negócio de médio porte necessita de 2.600 horas de trabalho para pagar seus impostos anuais. O mesmo tipo de negócio pagaria 69% de seu lucro em impostos no segundo ano.

O que determina o bom empreendedorismo no Brasil é a habilidade de navegar pela burocracia. Eduardo Gianetti da Fonseca, entrevistado pela revista, diz, ao final, que, se o Bill Gates tivesse começado a Microsoft em uma garagem no Brasil, ela estaria ainda hoje na garagem. O artigo é concluído com a seguinte frase: “Mais difícil de entender por que os empreendedores brasileiros são como são é entender por que eles, afinal de contas, existem”.

Ao terminar de ler esse artigo, eu não sabia se devia ficar feliz ou se triste e preocupado. Talvez eu devesse ficar feliz. Por quê? Ora, é fato notório que o Brasil, apesar de toda sua potencial criatividade, não produz inovação como poderia. O motivo para isso poderia ser mais grave, por exemplo, a falta de imaginação de nossos profissionais, ou a falta de disposição em empreender.

Mas não é isso, felizmente. O problema é cultural. Tudo bem, problemas culturais levam tempo para ser resolvidos, mas podem ser resolvidos. Basta atitude.

A pergunta que permanece é: Quando o país vai acordar e perceber que sua atitude autofágica o está destruindo aos poucos? Existe algo pior do que ter potencial e não saber aproveitá-lo?

Os métodos governamentais devem ser urgentemente revistos. Nossa postura deve mudar. Precisamos entender que, para se empreender, abre-se mão de certo conforto inicial, corre-se um risco que pode ser significativo, mas com o tempo os frutos poderão ser colhidos. A lei brasileira não foi feita para a inovação.

As agências de fomento à inovação precisam experimentar outros caminhos. Seus gestores precisam compreender que o processo de criação é mais de imaginação do que de organização, e que o processo de inovação tem aí o seu princípio. É preciso diminuir o controle, a burocracia, e premiar as ideias inéditas, assim como os resultados inovadores.

Mas não é só o governo e suas instituições que devem mudar. O método de gestão adotado pela maioria das empresas brasileiras tem sua herança na revolução industrial, e está atrasada mais do que o país pode suportar. É hora de acordar. É hora de mudar.

Extraído do livro "mentes criativas, projetos inovadores" - Klaus de Geus - "crônicas corporativas" ao final do capítulo 9, página 191.

domingo, 20 de março de 2011

Gestão de empresas, inovação e bossa nova

Gosto não se discute. Mentira. Gosto é uma questão de cultura, de busca, de muito esforço. A capacidade de apreciar um bom vinho não cai do céu. É fruto de tentativas e refinamentos. É algo relacionado ao juízo sintético, do filósofo Immanuel Kant, ou seja, é fruto da experiência. A bossa nova, legítimo fruto da cultura, intelectualidade e criatividade brasileira, não surgiu do nada. Foi preciso um longo caminho para se chegar lá. A bossa nova incorpora riquezas inusitadas, inovadoras, que muitas vezes causam estranheza aos ouvidos menos preparados. Sua harmonia e seus acordes dissonantes lhe conferem uma assinatura única, apreciada pelos mais eruditos músicos do mundo.

Com todas essas características desenvolvidas, a bossa nova pode parecer algo "desafinado" (fazendo alusão à grande obra de Tom Jobim e Newton Mendonça) para os ouvidos acostumados apenas com os estilos mais populares, para os que ouvem aquilo que é padrão, aquilo que é perfeitamente redondo. Para esses ouvidos, não há espaço para refinamento, já que se usa a justificativa de que gosto não se discute. Nada parece ser mais correto do que aquilo que sempre se ouve, uma vez que o óbvio reina absoluto.

Mas o que é que a bossa nova tem a ver com a inovação ou a gestão de empresas? Tudo. O que acontece na mente dos gestores é exatamente aquilo que acontece com aqueles cujos ouvidos não experimentam o refinamento. Fala-se em fazer diferente e em inovar, usam-se jargões do tipo "agregar valor" e "alcançar diferencial", porém não se experimenta, não se arrisca, e foge-se do incerto, dos desafios que envolvem o desconhecido. Ora, inovar é justamente fazer algo novo, onde pelo menos alguma coisa é incerta. Como se pode inovar sem se lançar no incerto?

No mundo empresarial brasileiro, pessoas criativas são normalmente vistas como acordes dissonantes. O questionamento por elas trazido à tona é normalmente refutado, pois as coisas já estão funcionando e não necessitam de palpites de sonhadores. Suas ideias não soam consonantes, e causam desconforto aos ouvidos menos preparados. O crescimento lhes é negado, pois não têm o perfil julgado necessário. A mente do gestor, assim como a mente do profissional em geral, ainda não se apercebeu da complexidade do pensamento humano. O mundo empresarial ainda não está preparado para lidar com as questões atuais, que adquirem cada vez mais um caráter interdisciplinar, complexo, onde as áreas do conhecimento se mesclam, gerando problemas que exigem soluções desconhecidas e devem, portanto, ser desenvolvidas de maneira, digamos, não automatizada.

A criatividade, principal ingrediente da inovação, ainda não tem uma definição formalmente aceita, nem pode ser compreendida em sua integralidade. Não se sabe ao certo como funciona, tanto na mente das pessoas criativas como na interação de pessoas visionárias. Infelizmente, a cultura de gestão vigente não gosta de riscos, não se sente confortável com a imaginação, o olhar diferente, pois isso tende a fugir de seu controle. Para evitar essa sensação que lhes é desagradável, gestores tradicionais exercem seu poder para o controle, matando a criatividade. Assim, o país continua ouvindo acordes totalmente consonantes e melodias cuja sequência se pode prever. E a bossa nova, com seu jeito "desafinado" e imprevisível, prossegue confinada aos ouvidos de quem sabe ouvir.

sábado, 12 de março de 2011

O casamento entre a ciência e a tecnologia

A brilhante matéria do economista Claudio de Moura Castro na Revista Veja de 09 de março de 2011, intitulada “a freirinha e o rabino”, e que discorre sobre as inter-relações entre o desenvolvimento científico e o tecnológico, pode ser resumida pela frase escolhida para destacar o texto: “Alimentar a tecnologia com ciência é como tentar promover o namoro da freira com o rabino. Eles professam crenças diferentes, custosas de conciliar”. O autor realmente foi muito feliz na analogia, pois as estatísticas comprovam o abismo existente entre o grande desenvolvimento da ciência brasileira nos últimos anos e seu pífio desempenho no contexto tecnológico.

Após ter lido, apreciado e refletido sobre o texto, peguei-me lucubrando sobre outros tipos de comparação entre ciência e tecnologia, focados no desafio que é construir a ponte sobre o abismo que separa esses dois mundos. Meu primeiro questionamento se deu quando percebi que o namoro entre uma freira e um rabino é algo que contradiz tudo aquilo de que se espera. Ao contrário disso, namoros e casamentos entre pessoas são esperados no aspecto geral na sociedade. Não apenas isso, eles são celebrados e ritualizados como verdadeiras heranças da história familiar humana, e tidos como base da sociedade.

A ciência e a tecnologia deveriam, de forma semelhante, casar-se e ser felizes, com toda celebração e rito, cumprindo as expectativas da sociedade. Entretanto, as estatísticas do IBGE dizem que grande parte dos casamentos acabam em divórcio, fato esse percebido nitidamente em nosso dia a dia. Percebi então que as inter-relações da ciência e da tecnologia poderiam, sim, ser racionalmente comparadas com àquelas relativas ao casamento em nossa sociedade.

Grande parte de nossas tentativas sistematizadas de unir a ciência e a tecnologia em programas e empreendimentos podem, analogamente ao casamento, acabar em dissolução definitiva. Faz parte do jogo. Porém há tentativas que certamente se sustentarão, produzindo filhos e, quem sabe, novas e vitoriosas gerações. O grande desafio não está em minimizar o risco de fracasso, mas sim maximizar a qualidade das tentativas bem-sucedidas. Quando se fala em inovação, produto natural do investimento em ciência e tecnologia, a eliminação do risco está fora de cogitação. O que está em jogo é justamente a tentativa, a experimentação, a mente aberta, o pensamento divergente, o agir desalinhado. Não há desenvolvimento sem mentes que pensam diferente.

As empresas brasileiras sofrem particularmente desse mal, a saber, o de matar a criatividade mediante processos de gestão inexoráveis, muito bem implementados, cujo objetivo é o correto funcionamento dos negócios e a consequente sobrevivência da empresa. Talvez seja por isso que as empresas brasileiras estão acostumadas com a luta pela sobrevivência. Se dessem lugar à criatividade e investissem na inovação, provavelmente não precisariam mais lutar para sobreviver.

O risco, a experimentação e o pensamento divergente deveriam ser prática comum nas empresas que têm como alvo inovar e contribuir com a sociedade não apenas com produtos padronizados, mas também com a oportunidade de desenvolvimento sustentado, que pode trazer os melhores frutos e benefícios sociais.

Unir a ciência e a tecnologia exige muito mais do que um processo sistematizado. Não estou com isso dizendo que a sistematização não seja necessária. Sim, ela é necessária justamente para que se consiga alcançar um diferencial sustentado. Entretanto, não se pode confiar inteiramente na sistematização, mesmo que ela tenha sido fruto de uma grande inovação. Não importam as circunstâncias, viver dos frutos alcançados e das glórias do passado é uma grande armadilha. Muitas empresas e muitas pessoas já sucumbiram nesse pensamento. Quebrar o que está estabelecido continuará sendo a única maneira de questionar, de pensar o diferente, de criar e, consequentemente, de inovar.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Volta às aulas de sempre

A volta às aulas é uma época peculiar, pois nos traz à mente a reflexão sobre como somos educados em nossa sociedade. Gostaria de poder avaliar o verdadeiro índice de aproveitamento das pessoas em seu longo caminho de capacitação para a vida, pois o sistema vigente continua preconizando a compreensão de fenômenos ou o conhecimento sobre determinada disciplina de forma isolada. Lembro-me das aulas de matemática, onde éramos ensinados a resolver uma conta ou, no máximo, um problema proposto que descrevia uma simples atividade do dia-a-dia. Jamais nos ensinaram a enxergar o que queriam dizer certas equações, o que havia por trás do mecanismo de resolução de um problema. Fomos criados para um mundo mecanicista.

Esse tipo de educação se reflete na maneira com a qual o país, mediante a atuação de suas empresas, busca criar valor e se desenvolver. Tudo gira em torno de resolver um problema pontual. Gestores estão acostumados a analisar números em suas planilhas e a definir metas neles baseadas. Tudo muito simples, tudo muito direto, tudo muito mecânico. Dessa maneira, preservamos nossa cultura de fazer sempre mais da mesma coisa, de imitar as empresas criadoras de países líderes, de nos restringir ao mundo operacional.

Por que? O motivo é simples. Durante todo o tempo que passamos na escola, pensar era motivo de punição. Criar era considerado rebeldia, desobediência às regras. Avaliar o desempenho de um aluno se baseia na capacidade que este tem de responder o que se quer que seja respondido. Fomos ensinados a responder perguntas óbvias, para as quais todo mundo sabe a resposta. Não fomos ensinados a fazer as perguntas. Fazer perguntas está reservado aos pensadores, aos sábios.

A revista BusinessWeek, da Bloomberg, publicou a lista das 50 empresas mais inovadoras de 2010. A pesquisa contou com a colaboração de importantes entidades, tais como o Boston Consulting Group, BCG-ValueScience, Reuters, Compustat e a própria Bloomberg. A pesquisa obteve alguns resultados comuns com outras realizadas sobre o mesmo tema. Todas elas concordam que os primeiros lugares estão reservados a empresas tais como a Apple e o Google. Outra característica comum entre as pesquisas diz respeito à nacionalidade das empresas inovadoras. Na pesquisa da BusinessWeek, a lista das 50 mais inovadoras inclui 22 dos Estados Unidos, 5 do Japão, 4 da Grã-Bretanha e da China, 3 da Alemanha e Coréia do Sul, 2 da Índia, 1 da Espanha, Canadá, Finlândia, Suiça, Itália, Taiwan e Brasil. A representante brasileira na lista é a Petrobras, na posição 41. De acordo com essa lista, portanto, dentre os países chamados “BRIC”, o Brasil ainda ocupa o terceiro lugar. É claro que essa lista não significa a verdade absoluta sobre a capacidade de inovação de um país, mas é considerada um índice importante, que pode ser usado como subsídio para análises sobre a formação da sociedade e sua capacidade de se desenvolver.

Diversos fatores dificultam uma maior representatividade do Brasil na lista dos mais inovadores. Um dos principais tem a ver com a educação, que por sua vez fundamenta a base cultural de uma postura contrária à inovação, que impõe barreiras impactantes no que diz respeito ao despertar do espírito criativo, empreendedor e inovador das corporações do país. Aquelas que conseguem fazer seu diferencial confiam normalmente na visão pessoal de seus líderes, a quem se deve o mérito da conquista.

A experiência educacional dos profissionais, entre eles os dirigentes das empresas, impõe uma postura voltada ao controle, à obediência às regras, à punição e, portanto, e acima de tudo, à operacionalização. A gestão torna-se então o freio que procura com todas as forças matar as iniciativas de empreendimentos por parte das pessoas que sempre confrontaram a postura vigente, o status quo, para supostamente trazer a ordem nos processos operacionais. Fazendo isso, a rotina se torna privilegiada, e, com ela, a automatização daquilo que já é sabido. Isso é necessário? Sim, é claro que é. Porém não é suficiente para levar o país a adquirir o diferencial prometido em seu discurso.

As atividades voltadas à inovação não podem ser geridas pelos mesmos mecanismos que regem as atividades operacionais, pois são baseadas essencialmente na criatividade, experimentação e conhecimento. Infelizmente, entretanto, a maior parte dos dirigentes empresariais ainda não acordou para esse fato, e perdem com isso grandes oportunidades de consolidar seus negócios e neles sobressair. Falta-lhes o insight de confiar na capacidade pessoal de seus colaboradores. Falta-lhes a coragem de traçar diretrizes e confiar no poder criativo e empreendedor das pessoas, para a formação de equipes vitoriosas.

Fazendo um paralelo com o contexto infantil, o que acontece na prática é mais ou menos o seguinte: Genitores (dirigentes) nomeiam babás (gestores) para tomar conta das crianças (profissionais) no parquinho. Quando uma delas (empreendedor) tenta subir no escorregador pela rampa em vez de usar as escadas, a babá intervém, ensinando-lhe aquilo que parece lógico: Sobe-se no escorregador pelas escadas e desce-se pela rampa. Com isso, mata-se o verdadeiro divertimento, que consiste em experimentar o novo, o diferente, novas sensações. Não nos é permitido, desde crianças, experimentar aquilo que pode trazer novos valores. Nossas babás não deixam, pois nunca brincaram. Mas elas sabem como devemos brincar. Elas nos observam de longe, atentas para que tudo “corra bem”. Foram programadas para tal.

sábado, 5 de março de 2011

A crise econômica e o desenvolvimento - artigo da época da crise de 2009 (julho/2009) - mas os conceitos ainda valem



O dilema que o mundo empresarial enfrenta na atual crise econômica é notório. Empresas dos mais variados setores do mercado têm sido obrigadas a rever seu planejamento e redefinir suas estratégias de investimento. As ondas negativas geradas pela crise, provindas de direções e contextos diversos, impactam a sociedade como num efeito dominó. As posturas das empresas variam de acordo com seu campo de atuação e também com sua visão de estratégia. O caminho mais sensato para a maioria delas é focar na sobrevivência primordialmente, deixando as questões voltadas ao seu desenvolvimento em segundo plano. O que isso significa? Significa focar naquilo que é urgente e por ora esquecer daquilo que pode garantir a sobrevivência da empresa no futuro em médio e longo prazos.

Situações adversas como a que estamos vivendo no momento nos colocam em uma encruzilhada. O investimento equivocado em questões voltadas ao futuro longínquo podem impactar o investimento nas questões operacionais de tal maneira a marcar a derrocada de um empreendimento. Por outro lado, empresas que se limitam a focar apenas as atividades operacionais como forma de garantir a sobrevivência, interrompendo qualquer investimento de futuro ou de capacitação, podem selar seu destino de ser apenas mais uma no mercado, enquanto subsistirem. É justamente a adversidade que pode mudar o curso do mercado, proporcionando a possibilidade de algumas empresas despontarem como potência e determinando a queda de outras que outrora eram inabaláveis em sua posição de liderança de mercado.

Nossa postura perante essa situação é, portanto, crucial na determinação de nosso futuro. Mais do que qualquer outra coisa, é hora de parar e pensar, promover a criatividade para a geração de novas soluções, tanto de produtos quanto de metodologia. É hora de planejar, e talvez até replanejar. É hora de olhar as coisas sob um ponto de vista alternativo. É hora de se perguntar por quê. É hora de redefinir o direcionamento do empreendimento, de forma a não só garantir sua sobrevivência como também de aproveitar a oportunidade, gerada pela adversidade, para adquirir um significativo diferencial competitivo. Apenas uma visão empreendedora, criativa e bem fundamentada poderá alcançar esse sucesso. Apenas uma postura ousada poderá transformar a tão temida crise em uma fonte de novos resultados.

Muitos empreendimentos conquistaram, nessas condições, importantes vitórias frente ao mercado. Algumas delas, entretanto, resignaram-se com o diferencial alcançado, e relaxaram assumindo que a vitória parcial fosse suficiente para lhe garantir o futuro. Algumas outras vieram inclusive a sucumbir perante um mercado dinâmico e extremamente competitivo, mesmo tendo estado à frente de sua concorrência pelo tempo que a sustentabilidade de suas inovações lhes permitiu.

É provável que o efeito da conquista de um diferencial seja similar ao efeito ocasionado pelas artimanhas negociais que nos levaram à atual crise financeira. Esse efeito nada mais é do que a falsa ilusão de que as conquistas são mais sustentáveis do que realmente são. Em um mundo em constantes mudanças, tanto em termos de oferta quanto em termos de demanda, confiar totalmente em um passo bem dado pode significar a derrocada definitiva. A sustentabilidade da inovação só é garantida quando o pensamento que a rege consiste em torná-la obsoleta. Para ser sustentável, a inovação deve estar constantemente se sobrepujando.

Por isso, torna-se essencial não apenas desafiar a crise com um novo olhar sobre o mercado como também adquirir uma postura de constantemente lutar para que a vantagem competitiva alcançada graças a esse novo olhar se reduza a zero. O futuro pertence aos que hoje enxergam além, mas o sucesso definitivo pertence aos que consistentemente questionam sua própria visão.

sexta-feira, 4 de março de 2011

da invenção à inovação - artigo publicado na Gazeta do Povo - Opinião - 27/09/2008

Recentemente foi divulgado pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) o resultado do edital do Programa de Subvenção Pesquisador na Empresa, que contava com uma verba total de R$ 60 milhões. O objetivo da carta-convite era incentivar as empresas a empregarem pesquisadores que desenvolvam projetos que possam gerar inovação. Em linhas gerais, projetos aprovados no programa podiam contemplar a contratação de pesquisadores cujos salários e encargos seriam subvencionados em 40 ou 60%, dependendo da região geográfica.

Foram aprovados 37 projetos, segundo o site da Finep, que contemplavam a contratação de 132 pesquisadores, sendo 84 mestres e 48 doutores. O valor total dos projetos aprovados somou R$ 10,5 milhões, o que representa 17,5% do total disponível. Esses números mostram que ainda há um longo caminho a percorrer para que a indústria brasileira tome consciência de que a inovação gerada por meio de conhecimento especializado é um mecanismo importante para a conquista de diferencial competitivo sustentado e, em casos mais críticos, pode significar a própria sobrevivência de empresas no mercado inerentemente dinâmico que nos aguarda no futuro próximo.

No Brasil, existe uma barreira entre a academia e a indústria que faz com que, apesar de o país apresentar uma contribuição significativa na produção científica mundial, a dificuldade de transformar invenções científicas em inovações práticas se acentue cada vez mais. Com isso, o país perde, deixando de gerar dividendos, tanto em termos de experiência e conhecimento quanto em termos de benefícios à sociedade.

Existem programas de fomento à produção científica que inerentemente contribuem para acentuar essa barreira, uma vez que eles prescindem de mecanismos que incentivem o envolvimento das indústrias, dificultando a evidência dos resultados obtidos por meio da aplicação prática.

Esse edital é um esforço governamental para ajudar a indústria do país a acordar. Mas, afinal, o que falta para isso? Primeiro, é preciso quebrar o muro que separa os dois mundos, academia e indústria, tornando-o, se possível, um único empreendimento que gere conhecimento e, com ela, a inovação. Em países mais avançados, o número de pesquisadores atuando na indústria é muito maior, o que permite uma atuação convergente e em sintonia com a academia, trazendo maior equilíbrio e melhores resultados para a sociedade.

Em segundo lugar, é preciso que o país comece a pensar diferente no que tange à gestão empresarial. A conjuntura econômica vivida pelo país nos últimos anos contribui com um certo temor que a gestão das empresas têm em arriscar. Isso é natural, porém muito perigoso. Essa cultura levou o país a pensar a indústria essencialmente como uma entidade de linha de produção, onde não há espaço para o pensamento, para a criação de novas soluções. Seus empregados são pagos para cumprir seu horário e desempenhar determinada tarefa sem questionamentos. Sua gestão é baseada em métodos que vêm da época da revolução industrial, que preconizam a produção em série, a eficiência do operacional, o valor traduzido em números. Na era do conhecimento, esses conceitos devem não só ser questionados, como também colocados em xeque. As empresas não podem mais se dar ao luxo de confiar apenas nos métodos industriais, buscando tão-somente a eficiência operacional. Não há mais espaço para essa cultura, especialmente em determinados segmentos, os quais dependem muito do conhecimento e da inovação para alcançar sucesso e garantir a sobrevivência num mercado extremamente dinâmico.