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quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Mudar o mundo

Às vezes eu me pergunto qual é a diferença fundamental entre pessoas ou empresas que exercem real impacto no mundo e aquelas que pensam ou existem aparentemente por conta de propósitos econômicos. Estou convicto de que a diferença realmente existe, uma vez que o propósito se evidencia nas linhas de ação tomadas. Normalmente as empresas que se enquadram no primeiro tipo nascem de pessoas visionárias, que desejam fazer algo de valor. A Apple, por exemplo, na visão de seu líder Steve Jobs, desejava simplesmente transformar o mundo por intermédio da tecnologia. E conseguiu. A ironia é que os websites desse tipo de empresa normalmente não fazem uso do tradicional artifício de explicitar sua missão e sua visão, como o faz o segundo tipo de empresas, que normalmente dizem que sua visão é ser, em um número menor possível de anos, a melhor empresa do setor. As empresas do primeiro tipo não precisam ter essa visão. A visão de transformar o mundo lhes basta. Afinal, é tão simples transformar o mundo...

Esse tipo de pensamento nos leva também a pensar no papel do sonho e da realização pessoal no contexto empresarial. O tipo de pessoa sonhadora normalmente tem dificuldades no ambiente empresarial tradicional, pois é vista como alguém desconectado do mundo. Já ouvi várias vezes frases do tipo "esse cara viaja" e "é um lunático". Um dos refúgios dos críticos a pessoas sonhadoras é rotulá-las como teóricas. Na verdade, esses críticos não levam em conta a teoria - e muito menos a imaginação - em suas ações. Os sonhadores, por sua vez, imaginam, e usam a teoria para dar base às suas ações. No fundo, uns buscam transformar o mundo, colocando a imaginação e a teoria como sustentação para ações que possam contribuir com esse nobre fim. Outros buscam refúgio na tentativa de sistematização do conhecimento, na "intocabilidade metodológica" como forma de garantir a continuidade da situação.

Uma coisa que tenho notado nesse tipo de ambiente é a turbulência que as pessoas sonhadoras exercem na situação sustentada pelo metodismo (não estou falando de religião). Em empresas sobreviventes tradicionais, a gestão é voltada à garantia de continuidade, ao método intocável e à minimização de riscos. Sonhadores representam uma ameaça brutal a essa tríade. Dessa maneira, empreendimentos vislumbrados por sonhadores e fundamentados no binário teoria-imaginação são veemente e camufladamente atacados pela gestão, na tentativa de aniquilar qualquer turbulência que implique aumento de risco. Os argumentos usados para justificar a reprovação de propostas sonhadoras normalmente não têm pé nem cabeça, e as sessões de julgamento parecem isentas de qualquer lógica, o que acaba por afetar, aos olhos dos sonhadores, a reputação daqueles que manifestam tais argumentações.

Os impactos desse tipo de repressão à inovação são diversos, a começar pela desmotivação e o descrédito por parte dos proponentes, o que causa a diminuição do potencial de inovação na empresa. Isso, por sua vez, traz sérios riscos relacionados à sobrevivência da empresa, e o destino obscuro tão temido pela gestão acaba se concretizando. O que está errado nesse processo? É justamente a falta de compreensão de que a saúde da empresa é hoje representada especialmente por sua capacidade de gerar o novo, de se questionar e mudar.

Sob o ponto de vista dos empreendedores sonhadores, a situação se torna insustentável. O que acontece na prática é que, "vestir a camisa da empresa", como ainda hoje se requer pela gestão, se torna uma tarefa impossível, já que o tamanho dessa camisa é PP. Recentemente ouvi uma preleção que dava a entender que o profissional deveria se confundir com a empresa. Para os sonhadores, isso até é possível, se a missão da empresa onde trabalha fosse "mudar o mundo". Caso contrário, eles estarão cada vez mais desconectados, já que ninguém pode segurá-los.