Em primeira mão, publico neste blog o principal trecho do editorial da edição 16 da revista Espaço Energia, prevista para maio de 2012.
A União Europeia elabora
anualmente um relatório, intitulado “Industrial
R&D Investment Scoreboard”, que contém dados importantes relacionados
ao investimento em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de empresas em contexto
mundial e segmentadas por suas áreas de atuação, além de outras informações
econômicas e financeiras referentes aos quatro últimos anos fiscais. Na mais
recente publicação, do ano de 2011, que apresenta informações relativas ao ano
de 2010, são listadas ao todo 1400 empresas classificadas pelo seu investimento
total em P&D. Desse total, 400 empresas têm sede nos Estados Unidos e 1000
em outros países. A empresa no topo da lista investiu 7.181,11 milhões de
Euros, enquanto que a última da lista investiu 30,70 milhões de Euros.
As empresas do setor elétrico
constantes no relatório somam vinte. A primeira dessa lista investiu 520
milhões de Euros, correspondentes a 4,7% de sua receita operacional líquida
(ROL). A última dessa lista, por sua vez, investiu 34,30 milhões de Euros,
correspondentes a 0,2% de sua ROL. Deve-se notar, entretanto, que essa pequena
lista de vinte empresas do setor elétrico contém duas empresas cujo valor de
investimento, apesar de significativamente maior do que 30 milhões de Euros,
corresponde a 0,1% de sua ROL. Digno de nota também é o fato de apenas quatro
dessas empresas possuírem investimento em P&D igual ou maior do que 1,0% de
sua ROL.
Lançando um olhar analítico para
a situação do setor elétrico brasileiro quando comparada com os números
supramencionados, alguns questionamentos podem vir à tona, os quais merecem
certa reflexão: Qual é a situação geral dos investimentos em P&D, abrangendo
os de natureza compulsória e os empreendimentos espontâneos? Considerando a
hipótese de que o programa de P&D compulsório e regulado pela ANEEL abarque
os maiores investimentos do setor, quais são os efeitos dessa regulação sobre
os empreendimentos dessa natureza? Qual é o papel do programa de P&D
regulado? Seria ele o grande (e talvez o único) catalisador da inovação no
setor elétrico? Quais são os passos necessários para que o país se torne
independente de regulação no que tange a investimentos em P&D, e adquira
uma visão de longo prazo, visando ao desenvolvimento e, em última análise, à
inserção do país como líder tecnológico nesse contexto? Quais são as estruturas
que devem ser mudadas para que isso aconteça? Qual é o grau de real
contribuição que um programa de P&D regulado pode dar ao país? Os
diferenciais competitivos alcançados e as inovações geradas em seu contexto são
significativos em relação aos empreendimentos espontâneos? Seria a distância
entre a academia e o empresariado maior no Brasil do que em outros países mais
desenvolvidos? Se sim, o que pode ser feito para que essa postura mude? Qual é
o impacto do processo de fiscalização sobre o grau de ousadia que uma empresa,
uma instituição ou um grupo de P&D pode ter em determinado empreendimento?
Estariam as outras instâncias envolvidas, de caráter de fiscalização, preparadas
para lidar com a ousadia de determinados empreendimentos e com a natureza
muitas vezes intangível de resultados obtidos, mas que no entanto contribuam
para um diferencial competitivo sustentado ao longo do tempo?
Considerando que o investimento
em P&D por parte de uma concessionária de energia, de acordo com o programa
regulado pela ANEEL, varie entre 0,4% e 1,0% de sua ROL, e que apenas quatro
empresas constantes no relatório supramencionado fazem investimentos iguais ou
maiores do que 1,0% da ROL, qual é a estratégia mais adequada para que o país
adquira uma posição mais privilegiada no tocante à inovação? Aumentar o nível
de investimento? Fomentar o desenvolvimento de empreendimentos espontâneos e
privilegiar resultados obtidos nesse contexto? Privilegiar o usufruto de
diferenciais competitivos alcançados por projetos de P&D, de tal maneira
que sua qualidade aumente, gerando um maior número de inovações?
É necessário progredir nas
estratégias que visam ao desenvolvimento do país e, em particular, do sistema
elétrico brasileiro, uma vez que se torna clara certa discrepância entre as
metas governamentais e dos vários setores da sociedade. Mais do que nunca, é
hora de consolidar uma estratégia de cooperação entre os diversos componentes
desse intricado quebra-cabeças.