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quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Falta senso crítico

Tenho ficado recentemente assustado e até mesmo estupefato com certos acontecimentos, certos procedimentos, certas decisões em contextos em que se esperava no mínimo uma pequena demonstração de competência. O que mais me assombra é que, ao analisar as pessoas envolvidas, parece não existir uma relação linear, ou mesmo polinomial, entre a competência formal, com base em seu histórico de formação, e a linha de pensamento por elas adotada. Posto isso, podemos lucubrar sobre os motivos para esse estranho comportamento.

A primeira conjectura é uma séria deficiência no processo educacional. As pessoas não conseguem exercer sua potencial inteligência porque não lhes foram ensinados os fundamentos do senso crítico. Em discursos de formatura, ouvimos (e às vezes proferimos) frases baseadas no conceito "mais importante do que saber as respostas é saber fazer as perguntas". Mas... será que temos aprendido a fazer perguntas na escola? Parece que não. Parece que o que realmente se quer é elevar os índices numéricos do país e chegar a um ponto em que possamos dizer para o mundo que aproximadamente 100% das pessoas têm curso superior. Claro, não estamos analisando o nível dos cursos superiores, pois, afinal, como podemos avaliar o nível de um curso superior se seus alunos não têm a base necessária para cursá-lo? Aliás, por que deveríamos nos preocupar com isso, pois o mais importante é o número, ou seja, a quantidade, e não a qualidade, não é mesmo?... Mas lembrem-se: os resultados falarão por si.

Estamos baixando o nível do ensino sob o pretexto da inclusão. O ensino deve se dar desde o nascimento. Isso, sim, é inclusão. Todos devem ter acesso, se possível, às mesmas oportunidades de crescimento. Entretanto, as pessoas diferem umas das outras. Em qualquer país desenvolvido, formam-se em curso superior apenas aqueles que adquiriram, de acordo com critérios pré-estabelecidos, sem entrar no mérito de sua pertinência, a capacidade para se formar e exercer a respectiva profissão. Ao forçar pessoas a serem o que não são e nem devem ser, estamos injetando em suas mentes respostas prontas, porém estamos também muito longe de ensiná-las a fazer perguntas. E o diferencial da competência é justamente esse: saber fazer perguntas, ou seja, senso crítico.

Agora vamos imaginar que o problema da educação não exista. O que poderia fazer com que as pessoas em papeis de liderança fugissem de sua responsabilidade de pensar? Por que temos visto neste país tantas estratégias equivocadas, tantos erros de gestão, tantas coisas mal feitas, enfim, tantos fiascos? Por que as pessoas têm esquecido de pensar? Vem-me à mente a saga "Star Trek" e a célebre frase dos "Borgs": "Resistir é inútil. Você será assimilado". A partir daí a pessoa passa a ser apenas uma peça no maquinário, teoricamente para o bem de todos. Hoje em dia, vemos as pessoas assimiladas pela força vigente, que preconiza a ignorância, a carência de um mínimo de qualidade, a prática destituída de teoria, o "sair fazendo" destituído de conhecimento, o repetir destituído de senso crítico.

Parece que todo mundo está entorpecido pelo poder. Ou parece que todo mundo está simplesmente entorpecido. Parece que não é mais permitido pensar. Parece que todos realizam uma atividade adotando certo procedimento porque foram assimilados para tal. Ninguém questiona. A desculpa mais ouvida para se defender uma ação absurda é que, apesar de parecer irracional, é necessário. O resultado é mais importante do que o conceito. Mas será que o resultado vai ser mesmo alcançado? E assim são desperdiçados os recursos que deveriam ser empregados para o bem da sociedade. As pessoas de bom senso vão pagando um preço alto demais  para viver em sanidade. Os honestos pagam a parcela dos que sonegam imposto, os que se  esforçam pagam a parcela dos que não se esforçam, a sociedade paga a conta da corrupção porque ela é, no fundo, considerada normal, os que apreciam sair para jantar com a família e beber um cálice de vinho pagam por aqueles que fazem da bebida uma arma. Isso é irracional. Isso é falta de senso crítico. Mesmo assim é normal.

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Editorial Espaço Energia 18 - Redes de pesquisa exigem vínculos perenes

Em seu comunicado número 152, de 2012, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) analisa as interações entre instituições acadêmicas e as empresas do setor elétrico no contexto do desenvolvimento de projetos de P&D. Nas conclusões, é mencionado o fato de que as estruturas de P&D das empresas ainda são fortemente voltadas aos requisitos burocráticos do programa. O estudo intitulado “P&D nos setores público e privado no Brasil: complementares ou substitutos?”, de Velho, Velho e Saenz, de 2004, defende que, apesar do incentivo à interação entre os setores acadêmico e empresarial, focado em empreendimentos específicos, não há investimento por parte das empresas, de modo geral, em infraestrutura própria de P&D. Com isso, os vínculos não se tornam perenes e, portanto, a formação de redes de pesquisa de caráter duradouro é prejudicada.

Um olhar informal sobre essa informação e sobre outras publicações recentes no tema permite-nos concluir que falta no setor empresarial uma postura mais ousada quanto a P&D. Seu principal resultado, que é o conhecimento gerado, que pode levar à aquisição de diferencial competitivo sustentável, normalmente deixa de ser assimilado pela empresa, devido à fragilidade do mecanismo de interação. Em outras palavras, a empresa deixa de se apropriar do principal resultado do P&D, porque não participa efetivamente da geração do conhecimento.


“Construir a ponte sobre o abismo existente entre a academia e a indústria” exige uma nova postura de gestão. O principal motivo para isso é que empreender P&D com vistas à inovação constitui uma atividade distinta das demais atividades empresariais, repleta de incertezas, e para as quais não há domínio de todo o conhecimento envolvido. Do contrário, não haveria geração de conhecimento. Métodos tradicionais de gestão tendem a afastar incertezas e minimizar riscos, e assim agem em direção oposta à natureza de atividades de P&D.


O setor industrial brasileiro e mundial tem muito a ganhar com a interação com o setor acadêmico, especialmente em mercados dinâmicos, onde a inovação passa a ter papel fundamental para a sustentabilidade das empresas. Uma nova postura empresarial em que a empresa efetivamente participa dos trabalhos baseados em conhecimento especializado e na criatividade científica será essencial para que esses ganhos possam enfim se concretizar.


Muitos serão os benefícios dessa nova postura ao país, mas o principal deles constitui-se em inovações para as quais o país já possui ingredientes suficientes, e que permitirão colher os frutos de seu próprio investimento. Porém, para chegar a essa nova postura e colher esses resultados, é necessário quebrar paradigmas, pensar diferente, testar novas configurações, promover experimentações e, enfim, valorizar a criatividade. O primeiro passo é deixar de tentar realizar atividades de diferentes naturezas usando sempre as mesmas técnicas.