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sexta-feira, 18 de abril de 2014

Na contramão do desenvolvimento

Recentemente os jornais noticiaram a queda de empresas brasileiras no ranking de investimento em inovação e em “pesquisa e desenvolvimento” (P&D), reiterando também que esses dados colocam o país na contramão da tendência mundial. Existe uma tendência natural de se vincular o investimento em P&D à inovação. Isso faz certo sentido, pois o objetivo primordial de P&D é gerar inovações baseadas em conhecimento especializado, que possam, por sua vez, gerar diferencial competitivo sustentável. Em outras palavras, a inovação gerada com P&D se diferencia de outros tipos de inovação pela magnitude e consistência do diferencial competitivo por ela gerado. Parafraseando a célebre frase do primeiro astronauta a pisar na superfície da Lua, seria como comparar um pequeno passo com um grande salto.

Entretanto, há sinais de que a notícia da queda das empresas no ranking represente um cenário ainda pior do que aquele que se evidencia à primeira vista, especialmente no que diz respeito à absorção, por parte das próprias empresas, dos resultados gerados em P&D. Para compreendermos isso, talvez seja necessário discorrer um pouco sobre o que é “tecnologia” e, assim, esclarecer também o termo “transferência de tecnologia”.

De acordo com definições consagradas, “tecnologia” se refere ao arcabouço ordenado de conhecimento empregado na produção e comercialização de bens e serviços, incluindo o de natureza científica, proveniente de todas as áreas da ciência, e o de natureza empírica, que é resultado de observações, experiência, atitudes específicas e até mesmo tradição oral e escrita. Assim, o termo “transferência de tecnologia”, ao contrário do que muitas vezes se imagina, não diz respeito apenas ao repasse de um produto tecnológico, mas também de todos os ingredientes necessários para sua obtenção, ou seja, o conhecimento técnico-científico, que é resultado de pesquisa científica, e fatores de produção, tudo isso necessário para se chegar ao produto tecnológico almejado. O objetivo primordial da transferência de tecnologia é, portanto, assegurar que o desenvolvimento científico e tecnológico seja mais amplamente acessível à sociedade.

Voltando então à questão principal, pergunta-se: qual é o grau de importância do parâmetro “investimento em P&D” para se adquirir o diferencial supramencionado? Ora, sem investimento em P&D, não há como gerar diferencial competitivo sustentável nos moldes daquele que estamos abordando aqui. Portanto, quanto maior o investimento, maior o potencial de resultados. Entretanto, há outro parâmetro igualmente importante nesta análise, a saber, o “grau de absorção de resultados” por parte do investidor. Dependendo da maneira com que se investe em P&D, é possível que o investidor esteja simplesmente doando recursos para a ciência, deixando de absorver os importantíssimos resultados auferidos no processo.

Uma vez que o termo tecnologia remete ao conhecimento e este, por sua vez, remete ao aprendizado, conclui-se que só se pode internalizar os resultados de P&D se se fizer parte do processo de aquisição do conhecimento. Não há como fazer transferência de conhecimento instantaneamente. Isso significa que investir em P&D não consiste apenas em injetar dinheiro em grupos de pesquisa ou em atividades externas de natureza científica. Significa também inserir-se na geração do conhecimento. Do contrário, os principais resultados (o grande salto) jamais serão absorvidos pelo investidor. Na contramão disso, o que se vê hoje no setor empresarial do país, em termos gerais, é o investimento equivocado em P&D, que muitas vezes é realizado devido a exigências de leis ou com o objetivo de obter benefícios fiscais. As empresas não participam da geração do conhecimento. Elas não têm tempo de aprender, pois estão focadas nas atividades operacionais vistas como o centro de seu negócio principal. A conclusão é que as ferramentas governamentais de fomento salvam a ciência no país, pois garantem a realização de pesquisas, mas não são suficientes para mudar a cultura empresarial de aversão ao conhecimento especializado, que provavelmente advém de fatores tais como a aversão a incertezas e a riscos intrínsecos, ou, em outras palavras, ao medo de não se obter o produto vislumbrado. O resultado é mostrado por notórias estatísticas: o país se destaca na produção de significativa parcela da ciência mundial, porém é fraquíssimo em inovação, relegando suas empresas a uma vergonhosa situação no cenário mundial.


quinta-feira, 17 de abril de 2014

Adonai Sant'Anna: Avaliação e Criatividade

Tive a honra de ter este texto publicado no blog do Prof Adonai Sant'Anna.



Adonai Sant'Anna: Avaliação e Criatividade: O texto abaixo foi escrito pelo professor Klaus de Geus , gerente de projetos de Pesquisa e Desenvolvimento na COPEL (Companhia Paranaens...

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Carga sociopolítica e sua natureza anti-inovação

Gostaria de traçar um paralelo entre a chamada "carga cognitiva" em sistemas virtuais de treinamento, tais como simuladores e games dedicados ao aprendizado, e aquilo que vou chamar de "carga sociopolítica" em uma organização empresarial. A primeira diz respeito ao esforço intelectual necessário para desempenhar as atividades que não estão diretamente ligadas ao processo de aprendizado, mas sim ao manuseio direto do sistema virtual. Quanto maior for a carga cognitiva, maior será a parcela de força intelectual que não é, de fato, utilizada para o aprendizado propriamente dito. Idealmente, um sistema virtual de treinamento deveria ter carga cognitiva nula para que todo o intelecto do aprendiz esteja focado naquilo que realmente interessa.

A carga sociopolítica de uma empresa é análoga à carga cognitiva, e diz respeito àquelas atividades que não se conectam diretamente à geração de valor. Normalmente a carga sociopolítica de uma empresa é alta quanto mais hierarquizada ela for, dando maior relevância a posições sociopolíticas. As tramas tribais que regem as atividades da carga sociopolítica desviam grande parte do intelecto existente na empresa para parâmetros que não trazem qualquer valor para a empresa e, portanto, fúteis. O exemplo mais comum de carga sociopolítica é constituído dos típicos enredos que acabam por determinar a divisão do poder na empresa, que normalmente se concretizam em alianças clandestinas de confiança e benefício mútuo, com intrínseco aspecto imoral. Afinal, aquilo que se faz escondido parece sempre se afastar da moralidade.

Da mesma maneira que no caso da carga cognitiva, parece natural que quanto maior for a carga sociopolítica em uma empresa, maior será a parcela de força que não será usada para os propósitos específicos inerentes aos seus negócios. As forças que regem a carga sociopolítica possuem uma característica agravante, a saber, a de prezar a estabilidade, uma vez que seus adeptos, com exceção de alguns possíveis esquecidos, quem sabe merecedores de algum castigo, estão confortavelmente gozando o ápice de suas medíocres carreiras (sim, medíocres, uma vez que posições são momentâneas e que, em contrapartida, obras permanecem), pelo menos até aquele momento. Ora, a estabilidade leva ao continuísmo e, este, por sua vez, lutará com todas as suas forças contra qualquer espécie de ameaça, tais como ideias provindas de mentes voltadas à criatividade e a gerar novas soluções. Assim, a carga sociopolítica se torna uma ferrenha inimiga da inovação.

A partir desse momento, as pessoas criativas que ainda tenham a determinação e a motivação para prosseguir em suas buscas começam a esmorecer, pois descobrem que estão lidando com forças que tornam a batalha desigual. Começam a perder as esperanças e, a partir daí, um processo de descrédito progressivo é iniciado, o qual não pode passar despercebido, e acaba por ser captado por outras mentes, minando ainda mais o potencial criativo da empresa. A tendência dessas pessoas, grandemente afetadas pela carga sociopolítica, é a de procurar a realização de seus empreendimentos alhures. Ao perder esse capital intelectual e empreendedor, a empresa se afunda ainda mais no ambiente tribal estabelecido.

As poucas que restarem, seja por determinação ou vã esperança na reputação da empresa onde trabalham, estarão sujeitas às ordens de incompetentes assoberbados, os quais farão de tudo em prol do controle, estipulando mecanismos de vigilância contra a desobediência e, portanto, contra o empreendedorismo. O empreendedorismo e a inovação são atividades de desobediência, de divergência e de antagonismo. São essas atividades que fazem as perguntas que normalmente não se querem ouvir. Este é o motivo pelo qual muitas empresas dizem querer buscar a inovação e ao mesmo tempo nunca estarão aptas para tal.